APOSTILA 14- ELIAS
Elias foi levantado no Reino do Norte em um momento de crise nacional. Surge nas páginas sagradas em I Rs.17:1 e de forma repentina, sem qualquer explicação, nem mesmo da sua genealogia, como é costumeiro fazer-se quando se trata, pelo menos, de personagens da história de Israel. É apresentado apenas como “Elias, o tisbita, dos moradores de Gileade”. “Elias” é a forma grega do nome, significa “Javé é Deus” e sintetiza, de forma sublime, todo o seu ministério profético: demonstrar ao povo do reino de Israel que o seu Deus é Javé, o mesmo “Eu sou o que sou” que havia Se revelado a Moisés no monte Horebe. Elias se tratava de pessoa que tinha um traje característico, diferente daqueles usados pelas pessoas de seu tempo, tanto que bastava a descrição desta vestimenta para identificá-lo, a saber: “…um homem vestido de pelos e com os lombos cingidos de um cinto de couro…” (cf. II Rs.1:8). Isto nos dá a entender que Elias deveria ter uma vida mais ou menos retirada da comunidade, uma espécie de “eremita” no deserto. No entanto, embora Elias demonstre, pelos seus trajes e pela forma repentina com que se apresenta na história sagrada, que deveria viver um tanto quanto retirado da comunidade, não é correto dizer que haja respaldo bíblico para dizer que vivia isolado dos demais homens do seu tempo. Pelo que podemos observar do texto sagrado, percebemos que Elias tinha uma relação bem próxima aos chamados “filhos dos profetas”, ou seja, aos jovens que se dedicavam ao estudo da Palavra de Deus e a uma vida de serviço ao Senhor nas “escolas de profetas”, cuja origem remonta aos tempos de Samuel (I Sm.10:5; 19:20). Com efeito, as páginas sagradas permitem-nos vislumbrar que Elias tinha um estreito relacionamento com estes grupos (II Rs.2:2, 4), sendo até possível que Elias tenha sido uma figura proeminente de tais grupos quando se apresentou ao rei Acabe, o que, aliás, explicaria a facilidade com que tenha conseguido se apresentar ao rei. Apesar de pouco conhecimento a respeito de Elias antes do início do embate com Acabe, Jezabel e os responsáveis pelo culto de Baal, tais informações já nos são preciosas no sentido de se mostrar que alguém, para ser usado eficazmente pelo Senhor, precisa ter dois pontos que havia na vida de Elias: um distanciamento do mundo e um comprometimento com a Palavra de Deus.
Elias não era uma pessoa que havia se misturado com as estruturas religiosas desvirtuadas e contaminadas do reino de Israel. Nos dias de Elias, vivia Israel uma situação espiritual extremamente difícil. O rei era Acabe, filho de Onri, o fundador da terceira dinastia (família real) do reino de Israel, o reino do norte, o reino das dez tribos que haviam se separado de Roboão, neto de Davi (cf. I Rs.12:16-25). Esta terceira família reinante não se apartou do pecado de Jeroboão, o primeiro rei de Israel (reino do norte), que havia criado um culto próprio, fazendo sacerdotes dos mais baixos entre o povo, e levando o povo a adorar dois bezerros de ouro, um situado em Dã e outro em Betel (cf. I Rs.12:26-33), tendo, além disso, Acabe se casado com Jezabel, filha do rei de Sidom, que, ao se mudar para Israel, trouxe com ela o culto a Baal, o deus da fertilidade dos fenícios, criando, assim, um culto rival ao culto a Deus. Servir a Deus nestas circunstâncias não era nada fácil, pois, ou se adotava o culto oficial do reino, criado no tempo de Jeroboão, idolátrico e totalmente desvirtuado das prescrições da lei de Moisés ou, então, se aderia ao culto a Baal, trazido por Jezabel e que alcançou grande popularidade. Isto explica o distanciamento físico não só de Elias, mas também dos filhos dos profetas, que não tinham espaço para, com liberdade, servir a Deus em meio a estruturas sociais altamente desfavoráveis a quem buscasse a presença do Senhor. Mas, ainda que possamos contemplar este distanciamento físico de Elias e dos demais que serviam a Deus naquele tempo, devemos ter como lição para os nossos dias deste comportamento do profeta não o distanciamento físico, mas, sim, o distanciamento espiritual. Embora muitos tenham se inspirado em Elias para tomar uma decisão de se apartar da sociedade a fim de servir a Deus, a lição que o profeta nos deixa é bem outra: é a da separação do mundo espiritual, da separação do pecado. Na nova aliança estabelecida por Jesus Cristo, não há espaço para “eremitas”, para pessoas que saem da sociedade para servir a Deus, mas, sim, pessoas que, a exemplo de Jesus, estão completamente separadas do pecado, mas vive no meio dos pecadores, para “…salvar alguns, arrebatando-os do fogo” (Jd.23 -parte inicial do versículo). Jesus disse que não somos do mundo, não podemos nos comprometer com ele (Jo.17:16), mas não pediu que do mundo fôssemos tirados (Jo.17:15), porque é necessário que sejamos sal da terra e luz do mundo (Mt.5:13,14).A outra lição que aprendemos com Elias, já neste instante em que ele surge nas Escrituras, é de que devemos estar sempre comprometidos com o estudo da Palavra de Deus, com a busca da presença de Deus. Elias tinha um carinho especial com os “filhos dos profetas”, com aqueles que, em meio a um mundo tão distante de Deus, dedicavam suas vidas para servir ao Senhor e informar-se a respeito da Sua Palavra. Devemos ter este mesmo compromisso, devemos nos aliar àqueles que têm este mesmo propósito. Ao nos reunirmos em classe, a cada Escola Bíblica Dominical, pomos em prática este exemplo deixado por Elias e, certamente, agradamos a Deus tanto quanto o profeta Lhe agradou no seu tempo. Elias surge no texto sagrado já desempenhando uma tarefa toda especial da parte de Deus. As Escrituras sempre mostram Elias na execução de uma tarefa, no desempenho de um encargo que lhe fora confiado pelo Senhor. Neste ponto, há até um paralelo entre a forma como se narra a história de Elias e como Marcos, o evangelista, narrou o ministério de Jesus, que, naquele livro, é apresentado como o incansável servo do Senhor, como um homem de ações e de atitudes. Impulsionado pelo Espírito de Deus, Elias se apresenta diante do rei Acabe e declara que não haveria nem chuva nem orvalho enquanto o próprio profeta não o pedisse a Deus (I Rs.17:1). Numa frase tão curta e sucinta, como é este versículo das Escrituras, encontramos um exercício imenso de fé, a conclusão de um processo que não deve ter sido simples. Elias, um profeta que vivia retirado da sociedade, é levado pelo Espírito a se apresentar nada mais nada menos que diante do próprio rei e a dizer que haveria uma grande seca até o instante em que ele pedisse a Deus que chovesse. Que coragem da parte do profeta! Que determinação, ou seja, que disposição firme de cumprir a Palavra de Deus! Nesta primeira palavra de Elias já se nota a missão que incumbiria ao profeta: mostrar que o Senhor era o verdadeiro Deus e não Baal. Baal era uma divindade que se entendia ser a controladora da natureza. A Baal se atribuía a fertilidade, ou seja, não só a reprodução dos animais, mas também a produção agrícola. Por isso, Baal era tido como o responsável pelas chuvas que permitiam as fartas colheitas e era costume entre os povos cananeus, inclusive os fenícios, procurar agradar a Baal e ter pequenas estatuetas deste deus e de Asera, a deusa da fertilidade, como forma de obter o favor deste deus e, assim, prosperidade na colheita. Ao dizer que não choveria até que houvesse um pedido do profeta a Deus, o Senhor está mostrando que é maior que Baal, que Ele, e não esta falsa divindade, tinha o controle sobre a natureza. Deus passou a sustentar o profeta que, junto a um ribeiro, onde havia água necessária à sua sobrevivência, passou a ser alimentado por corvos, que lhe traziam pão e carne pela manhã e pela noite (I Rs.17:6). Deus, assim, mostrava, duas vezes ao dia, ao profeta que estava no controle de todas as coisas, que toda a natureza estava sob as Suas ordens. Era uma experiência singular para Elias, que tinha de enfrentar o culto a Baal, apresentado como “deus da natureza”. Elias não só deveria saber intelectualmente que Deus era o único Senhor, mas também precisaria experimentar esta realidade. Quando o ribeiro secou, Deus, então, mandou que o profeta fosse para Sarepta, cidade pertencente a Sidom, pois o Senhor havia ordenado a uma viúva que sustentasse o profeta (I Rs.17:9). Vemos, aqui, que Deus, depois de mostrar que tinha controle sobre a natureza, estava agora a mostrar ao profeta que também era o controlador da humanidade e das estruturas sociais. Em primeiro lugar, Deus manda que Elias deixe a região de sua morada, a região de Gileade, região que lhe era conhecida, para que fosse a uma terra estrangeira, um lugar desconhecido, de outros costumes, onde o profeta não poderia se valer de seus conhecimentos de vida. Tratava-se de mais um passo de fé que se exigia do profeta, prova de que Elias havia galgado mais um patamar da vida espiritual. Como diz o apóstolo Tiago, quanto mais nos chegamos a Deus, mais Ele Se chega até nós (Tg.4:8). Como já havia experimentado a Providência divina, o profeta pôde, com autoridade, mandar à viúva, que encontrou apanhando lenha, que lhe trouxesse um vaso com pouco d’água para que bebesse e, depois, lhe pediu um bocado de pão. Ante a afirmativa da mulher de que não tinha senão o suficiente para uma última refeição, o profeta mandou-lhe que fizesse primeiro um bolo pequeno para ele e, depois, então, preparasse alimento a ela e a seu filho, pois, enquanto não chovesse, haveria alimento para eles (I Rs.17:14,15). Elias já sabia que Deus garantiria a sua sobrevivência e se havia ordenado que aquela viúva lhe sustentasse, esta garantia se estendia também a casa dela.
O filho da viúva adoeceu, a doença que se agravou e levou o filho da viúva à morte (I Rs.17:17). Apesar de sustentada pelo poder do Deus dos hebreus, a viúva, ela própria uma gentia, não hesitou em culpar o profeta pela morte de seu filho, como se fosse uma vingança de Baal contra o fato de a viúva estar a acolher um israelita em sua casa. Desafiado pela viúva, o profeta demonstrou, uma vez mais, a sua fé. Pediu o corpo do filho e o levou para o seu quarto, onde, em particular, clamou ao Senhor, pedindo que se restituísse a vida ao morto. Elias foi primeiro a fazer um milagre desta natureza, a revelar quem era Deus e do que Ele era capaz de fazer. E a Bíblia nos diz que “o Senhor ouviu a voz de Elias e a alma do menino tornou a entrar nele e reviveu” (I Rs.17:22). O resultado deste milagre foi o reconhecimento, pela viúva, de que “Javé é Deus” e de que Elias era o Seu legítimo profeta (I Rs.17:24).
- Após a ressurreição do filho da viúva de Sarepta, Elias havia concluído o período de aprendizado sobre a superioridade de Deus sobre Baal. Devidamente experimentado na sua vida com Deus, durante três anos e seis meses (cf. Tg.5:17), estava pronto para um novo embate com o rei Acabe. A seca era terrível, cumpria-se à risca o que havia sido profetizado por Elias e, então, o Senhor mandou que o profeta, uma vez mais, se apresentasse diante de Acabe, porque chegara o momento de chover sobre a terra (I Rs.18:1). Quando ia em direção a Acabe, Elias se encontrou com o mordomo do rei, Obadias, que era uma pessoa temente a Deus, o qual, inclusive, havia escondido profetas do Senhor em cavernas e providenciado o seu sustento em meio a grande seca e à implacável perseguição desenvolvida por Acabe contra os servos de Deus. Este relato bíblico mostra-nos que Deus não só havia cuidado de Elias, como também de todos os Seus profetas. Elias fica sabendo também que o rei Acabe o havia procurado em todos os lugares, a demonstrar, mais uma vez, que o Senhor o havia escondido, o havia não só sustentado, mas também protegido (I Rs.18:10). Também foi cientificado de que não era o único a ter obtido a proteção e sustento da parte de Deus, que os profetas, aqueles com quem Elias tinha tanto cuidado, também haviam sido guardados, pela mão de Obadias.
O encontro entre Elias e Acabe bem mostra como não há comunhão entre a luz e as trevas (II Co.6:14). Elias havia profetizado e a profecia se cumpria integralmente, o que mostrava ser ele um profeta que vinha da parte de Deus (Dt.18:21,22). Deveria, pois, o rei Acabe respeitá-lo, considerá-lo. Mas, pelo contrário, ao se encontrar com Elias, o rei o chama de “o perturbador de Israel” (I Rs.18:17). O profeta Elias, porém, não se abateu por causa desta ofensa, desta palavra mentirosa do rei, como também não ficou preocupado pelo fato de o rei lhe ser hostil (ninguém pense que este encontro se deu a sós. O rei, certamente, fazia-se acompanhar de sua guarda pessoal, enquanto que Elias estava só). Antes, com autoridade, disse que quem era o perturbador de Isael era o próprio rei, uma vez que ele havia deixado os mandamentos do Senhor e seguido a Baal e, devidamente orientado por Deus, lançou o desafio da reunião de todos no monte Carmelo, a fim de que se demonstrasse quem é o verdadeiro Deus (I Rs.18:19,20). Devidamente experimentado e tendo vivido que Deus é o único Deus, Elias poderia lançar este desafio, a fim de proclamar a todo o povo o que havia aprendido. O povo se reuniu e Elias, sem medo, apresentou-se ao povo, exigindo dele uma definição. “Até quando coxeareis entre dois pensamentos? Se o Senhor é Deus, segui-O e, se é Baal, segui-o.” (I Rs.18:21). Israel vivia, nos dias de Elias, uma verdadeira “apostasia nacional”, pois todo o país estava se enveredando pelo culto a Baal. O próprio Deus diria a Elias, pouco depois, que apenas sete mil pessoas não haviam dobrado seus joelhos a Baal nem o haviam beijado, um número bem diminuto frente a uma população que deveria ser bem maior (I Rs.19:18).
O desafio de Elias foi apresentado: o Deus verdadeiro deveria responder com fogo a aceitação do sacrifício que Lhe fosse dado. Elias tinha experimentado o pleno domínio de Deus sobre a natureza e tinha, assim, portanto, convicção de que somente Deus responderia com fogo a um sacrifício. Os profetas de Baal e de Asera, num total de oitocentos e cinquenta (I Rs.18:19), tentaram, durante toda a manhã, resposta de seus deuses para o sacrifício, sem resultado. Elias, então, depois que havia deixado tempo suficiente para que Baal respondesse ao sacrifício, oferece o seu sacrifício diante de Deus. Como Deus não é Deus de confusão (I Co.14:33), reparou o altar, que estava quebrado, bem como pôs água abundante para que não houvesse qualquer dúvida de que era Deus quem iria operar.
Além de ter reparado o altar e não deixado margem a qualquer dúvida, Elias fez uma oração. Elias não “determinou” coisa alguma a Deus, pois sua “determinação”, como vimos, é a disposição firme de servir a Deus, não qualquer exigência que devesse ser feita, como muitos iludidos atrevem-se a fazer em os nossos dias. Elias fez uma oração, um pedido a Deus, reconhecendo a Sua soberania, o Seu senhorio. Ele poderia chamar Deus de Senhor, porque havia experimentado o controle de Deus sobre todas as coisas: o corvo, a panela da viúva, a vida do filho da viúva. O Senhor consumiu tudo com o fogo e o povo não teve mais dúvida alguma: só o Senhor é Deus! (I Rs.18:36-39).
Texto formulado com base nos comentários da Bíblia de Genebra, Quem é quem na Bíblia Sagrada (ed. Vida), La vida de Elias (El Estandarte de La Verdad), principalmente do site:
www.ensinodominical.com.br/elias-um-profeta-humilde-e-determinado-1/

Janoí Mamedes
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